Nathalia Santos Camargo
Com a
Linguística Textual, que tem por seu objeto o texto, o compreendemos como
“fruto de um processo extremamente complexo de linguagem e interação social, de
construção social de sujeitos, de conhecimentos de natureza diversa” (KOCH,
2016, p. 18). Quando escrevemos um texto temos por objetivo transmitir uma
mensagem, que pode visar informar, anunciar, argumentar, e que, por isso, carrega
uma intenção e que esta precisa ser aceitável. Todo texto insere-se em um contexto,
em uma situação de comunicação. É dito por alguém, que se situa em um
lugar, a outro alguém, que se situa em outro. Compreende uma série de
conhecimentos compartilhados e seleciona informações que possam ser relevantes.
Diante da intenção de transmitir algo, é necessário construí-lo e torná-lo
coerente e coeso.
O que
torna um texto coerente é a capacidade de organizar ideias de forma lógica,
onde os elementos conectam-se e constroem sentidos. No entanto, há elementos
que “não estão visíveis na ponta do iceberg”, exigindo do leitor perspicácia para ativar
seu conhecimento de mundo e compreender quais referências foram usadas pelo
autor para construir sentidos (BENTES, 2008). Atentando-se para como as ideias
do texto são encadeadas e conectadas, devemos conhecer e utilizar alguns
recursos linguísticos que tornam um texto fluido e coeso. Alguns desses
recursos são:
Coesão referencial – Substituição
(anafórica ou catafórica); Reiteração;
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Substituição
– Este recurso serve para retomar o referente ou antecipar um elemento que
será introduzido no texto. Ex.: “(14) Mariana e Luiz Paulo são irmãos. Ambos
estudam inglês e francês. ” (FÁVERO, 2002, p. 20)
Ø Anáfora
– “O homem tinha cabelos ruivos de
verdade, vermelhos como a chama. Seus olhos eram escuros e distantes,
e ele se movia com a segurança sutil de quem conhece muitas coisas. ”
(ROTHFUSS, 2009, p. 9, grifos nossos)
Ø Catáfora
– “Olhou para as mãos, uma aninhada na outra, ambas descansando no colo.
Passado um momento, ele as levantou e abriu, como que para aquecê-las
junto ao fogo. Eram graciosas, com dedos longos e delicados. Kote as observou com atenção, como se
esperasse vê-las fazerem alguma coisa sozinhas. ” (ROTHFUSS, 2009, p. 35,
grifos nossos)
Reiteração – Este
recurso utiliza-se da repetição de expressões no texto, para gerar certo sentido ou ênfase. Ex.: “(27) O fogo
acabou com tudo. A casa estava
destruída. Da casa não sobrara nada. ” (FÁVERO, 2002, p. 23)
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Coesão
recorrencial – Recorrência de termos; Paralelismo; Paráfrase;
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Recorrência
de termos – Para além da repetição de termos, a
ideia é assinalar um fluxo, uma progressão. Ex.: “(38) Pedro pedreiro, pedreiro esperando o trem que já vem, que já vem, que já vem, que já vem...” (Chico Buarque) (FÁVERO, 2002, p. 27)
Paralelismo
– Neste recurso, a estrutura de um texto é reutilizada, contudo, com um
conteúdo diferente. Ex.: “(1) Ele acordou, desceu as escadas, comeu
rapidamente e varreu a casa. ” (BORGES, 2011, p. 7)
Paráfrase
– Desta forma procura-se uma maneira diferente de dizer algo que já foi dito.
Ex.:
Texto
original – “Minha terra tem palmeiras /Onde
canta o sabiá, /As aves que aqui gorjeiam /Não gorjeiam como lá. ” (Gonçalves
Dias, Canção do exílio)
Paráfrase
do texto original – “Minha terra tem palmares
/Onde gorjeia o mar /Os passarinhos daqui /Não cantam como os de lá. ”
(Oswald de Andrade, Canto de regresso à pátria)
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Coesão
sequencial – Sequenciação temporal; Sequenciação por conexão;
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Sequenciação
temporal – Utiliza-se este recurso para a indicação
de tempo ou ordenação linear de elementos. Ex.: “(48) Primeiro vi a moto,
depois o ônibus. ” (FÁVERO, 2002, p. 34)
Sequenciação
por conexão –
Aqui, um enunciado está subordinado a outro para ter sentido. Ex.: “(59) Se tivesse asas, voaria até o Sol.”
(FÁVERO, 2002, p. 36)
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O texto revela o
quanto construir sentidos solicita conhecimentos para o estabelecimento de links, para a identificação e
caracterização do referente, para tecer comparações, para tomar decisões, para
não ficarmos apenas na linearidade do texto, enfim. (KOCH, 2016, p. 23)
Os
recursos de coesão textual são fundamentais para ligar elementos, ordenar e construir
movimentos, dar continuidade. É o modo como as palavras e frases encontram-se “amarradas”
na superfície do texto. Contudo, não são apenas “a costura do texto”,
fundamental para que as ideias conectem-se, para além de uma estruturação, eles
são intencionais e revelam, às vezes, a que sentido um autor quer chegar. Ao usar a
catáfora, por exemplo, e deixar para depois a revelação de um referente, um
nome, cria-se um suspense. Ao usar a recorrência de termos, pode-se observar a
continuidade de um gesto ou de um movimento. Portanto, esses recursos nos permitem
brincar com os sentidos do texto a partir de sua construção.
REFERÊNCIAS
ANDRADE,
O. Canto de regresso à pátria.
Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/aulusmm/files/2017/05/Canto-de-regresso-%c3%a0-p%c3%a1tria.pdf. Acesso em: 11 ago. 2020.
BENTES,
A. C. Linguística Textual. In: MUSSALIM,
F.; BENTES, A. C. Introdução à
Linguística: domínios e fronteiras – volume 1. São Paulo: Cortez, 2008, p.
245-285.
BORGES,
H. Paralelismo gramatical, coordenação e
correlação na produção textual de estudantes de ensino médio em Brasília.
2011. Monografia (Bacharelado em Letras), Universidade de Brasília – UNB,
Brasília, 2011.
DIAS,
G. Canção do exílio. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000100.pdf. Acesso em: 11 ago. 2020.
FÁVERO,
L. L. Coesão e coerência textuais.
São Paulo: Ática, 2002.
KOCH,
I. V.; ELIAS, V. M. Escrever e
argumentar. São Paulo: Contexto, 2016.
ROTHFUSS,
P. O nome do vento. São Paulo:
Arqueiro, 2009.